06 dezembro 2007

A Retórica

Amada por uns e contestada por outros, a Retórica tem sido, ao longo dos tempos, alvo de «paixões» e de «ódios».
Para se perceber o que se entende por Retórica e qual o seu objectivo convém, antes de mais, determo-nos um pouco sobre o nome. Formado pela raiz «re», que significa dizer, e por «tórica», onde se subentende «arte», esta palavra serviu, inicialmente, para designar a «arte de bem falar». Renato Barilli vai um pouco mais longe" e afirma que é a «ocasião em que se usa o discurso da forma mais plena e total». Podemos considerar que esta tem por objectivo uma tríplice finalidade: «docere» (ensinar), «movere» (atingir os sentimentos) e «delectare» (deleitar).
A Retórica nasceu no século v a. c., em Siracusa, na Sicília, em virtude da necessidade da reivindicação de umas terras com as quais Gélon e Héron tinham reorganizado o espaço de Siracusa. Quando, algum tempo depois, foram depostos por uma subversão popular e se estabeleceu a democracia, os cidadãos reivindicaram as suas anteriores propriedades. A forma de julgar essas pretensões consistia em argumentar, discursando, diante de um vasto júri popular mobilizado para o efeito. A partir daqui acentua-se a consciência dos efeitos da linguagem e da necessidade de reflectir sobre a questão e, ao mesmo tempo, criar regras que permitissem construir o discurso com vista à persua­são. Deste momento até ao ensino da retórica e à constitui­ção de manuais foi um passo curto. Corax e Tísias apare­cem como os primeiros professores e é também a eles que são atribuídos os primeiros manuais de retórica.
Da Grécia passou a Roma, onde se destaca a figura de Cícero, entre outros. Os séculos foram passando e o uso da Retórica foi-se tornando cada vez mais frequente e sinónimo de erudição. Eis que no século XVIII e XIX surge um movimento anti-retoricista devido ao exagero de ornato presente nos textos, tornando-os não só de difícil compreensão como ocos de sentido. Estes viviam sobretudo da forma descurando, assim, o seu conteúdo. Nesta altura, falar em retórica era dar -lhe um sentido pejorativo. Expressões como «perder-se em divagações retóricas», «não passa de um discurso retórico» e «um mero exercício de retórica», entre outras, servem, ainda hoje, para desi­gnar um discurso cujo conteúdo é nulo. Tudo tem de ter o seu tempero adequado e o mesmo se passa com a retó­rica. Ela pode ajudar-nos a compor um belo texto ou então a «excessiva preocupación por la forma» de que nos fala Ascoli destruirá, por completo, a função desse mesmo texto. Para isso, este autor considera a Retórica como um cancro e Manzoni chama-lhe «a epidemia do século».
A retórica, tantos séculos após o seu nascimento, é hoje um corpo tão abrangente que serve não só para convencer como também para agradar, para combater como para deliberar, para raciocinar como para seduzir.
Longe das ideologias do Barroco e quase a entrar no século XXI, a Retórica é estudada nos estabelecimentos de ensino em toda a sua plenitude. Contudo, não quei­ramos, pelo seu uso exagerado, condená-la à agonia dos séculos XVIII e XIX.

Platão, Górgias, Fernanda Carrilho

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