01 novembro 2012

No pensar é que está o ganho!


«Pensar», respondi eu. Franziram o nariz. Perguntavam-me se veria algum caminho para a resolução das crises que nos assolam. As crises que por aí andam a torturar-nos a felicidade são de índoles várias. Temos a crise de valores, a crise económica, a crise política, a crise de fé, a crise de afectos. Todas elas estão relacionadas entre si e conspiram para nos atazanar o juízo. Daí, talvez que a urgência da pergunta esperasse da resposta uma solução concreta, prática, rápida.
A minha resposta era o oposto. Não por embirração, mas por convicção. Estará subvalorizada a importância do pensamento crítico, estruturado e criativo na resolução dos problemas que nos afligem. Talvez se deva ao ritmo frenético a que vivemos e que obriga à tomada de decisões imediata, que resulta, frequentemente, numa tomada de decisões irreflectida. Haverá, pois, quem valorize mais a acção, mas tenho para mim que acção sem pensamento que a sustente é tão estéril quanto o pensamento que não gera acção. 
(...)
O importante é deixarmos as certezas que tínhamos de lado e darmo-nos à interrogação. Não o poderemos fazer sozinhos, claro. Devemos acompanhar-nos de bons mestres. Os mais importantes são os livros. Mas todas as formas artísticas ajudam a desarranjar a mente para que a possamos voltar a arranjar depois. Será por isso que os inimigos do livre pensamento tanto tentam apequenar as artes e a cultura.
(Parte de texto de Ana Bacalhau publicado no Diário de Notíciasi)

01 outubro 2012

O que é a validade de um argumento?

A validade tem a ver com o seguinte:
Com a relação entre premissas e conclusão: num argumento válido premissas sustentam, apoiam ou justificam logicamente uma conclusão;
Com a  relação entre o valor de verdade das premissas e o valor de verdade da conclusão:

Um argumento válido é aquele em que se as premissas fossem verdadeiras e houvesse uma ligação logicamente correta, a conclusão seria necessariamente verdadeira (é impossível ser falsa – VALIDADE DEDUTIVA).
 ex.
Todos os abdus (A) são zeblins  (B)
Imal(C) é um abdu (A)
Logo, Imal (C) é um zeblim (B)

2. Um argumento válido é aquele em que se as premissas fossem verdadeiras e houvesse uma ligação logicamente correta, a conclusão seria muito provavelmente verdadeira
      (é improvável mas não impossível ser falsa – VALIDADE INDUTIVA).

ex.
Todos os cisnes observados até hoje são brancos
Logo,  todos os cisnes são brancos



Bem-vindo ao Alfafilos, ano letivo 2012-13!

09 junho 2012

Seremos bestas?

Uma célebre frase do Filósofo grego Aristóteles diz que “o homem é por natureza um animal político”. Pretendia este pensador salientar que faz parte da natureza humana viver e participar num estado e numa sociedade política. Pretendia também Aristóteles chamar atenção para a inevitalidade da ligação e integração do ser humano no Estado chegando a afirmar que nenhum homem se consegue colocar à margem do sistema social/político. Quem vivesse à margem do estado e do sistema social/político ou seria um Deus ou uma besta. Como explicar então que, sendo vítimas de um sistema social/político onde a ética, a justiça, a equidade, a solidariedade, a transparência, a verdade e o respeito são pura ficção, continuemos alheados da participação cívica e política? Como explicar a nossa inércia cívica, estando conscientes que essa atitude tem permitido que dezenas de responsáveis políticos/económicos/institucionais e seus correligionários continuem a levar o país para o abismo? Como explicar o nosso alheamento face à participação no sistema político e, sobretudo, face aos partidos que são o pilar (infelizmente frágil) da nossa democracia? Ora, aceitando que Aristóteles tem alguma razão, aceitando que não somos deuses, pergunto:  seremos bestas? 

17 março 2012

Dúvida Hiperbólica!


1. É, incontestavelmente, uma das figuras mais proeminentes da história do pensamento humano. Foi matemático, foi cientista e foi, sobretudo, um grande filósofo, tendo sido considerado o pai da filosofia moderna. Refiro-me a Descartes que viveu apenas 56 anos, mas teve tempo de viajar e aprender por muitos países da europa, num tempo e sociedade ainda tolhida pelo feudalismo, por regimes políticos absolutistas onde a liberdade, a criatividade e a descoberta eram ainda heresias sufocadas por uma Igreja Católica inquisitória que não olhava a meios para atingir os seus fins “sagrados”. É o único filósofo que se manteve, nos últimos 20 anos, insubstituível nos programas de filosofia do Ensino Secundário. Muitas vezes me interrogo porque é que filósofos como Descartes se mantêm como referências do conhecimento humano durante séculos (Descartes viveu entre 1596 e 1650). No entanto, há que reconhecer que além do seu importante contributo para matemática, a filosofia e a ciência Descartes teve outro mérito não menos importante: quis, no século XVII, reformar ou refundar todo o conhecimento humano. Este assentava em princípios escolásticos da idade média onde o espírito científico ou de investigação eram substituídos pelo ensino retórico e livresco. Descartes percebeu que, naquele tempo, era fundamental demolir o velho saber e reconstruir um “novo edifício do conhecimento” assente em bases sólidas. Para essa empreitada considerou fundamental como princípio metodológico a “dúvida” levada até às últimas consequências, sendo por isso considerada uma dúvida hiperbólica que punha em causa não só as crenças mais básicas do seu tempo mas também, por exemplo, a existência do mundo físico e, inclusivamente, a do próprio Descartes.

2. Há dias esteve em Portugal Michael Marmot*, professor catedrático especialista em Epidemiologia e Saúde Pública e director do Instituto Internacional para a Sociedade e Saúde na University College de Londres. Este investigador levantou várias questões decorrentes de estudos científicos credíveis que fragilizam a maioria das decisões políticas dos nossos governantes da atualidade. Vejamos alguns exemplos. Estudos comprovam que “por cada 1% na subida da taxa de desemprego, os suicídios crescem 0,8%”. Marmot sustenta também que o grupo social a que se pertence é determinante em termos de saúde ou de educação: "Se se for pobre e burro fica-se burro, se se for burro e rico recupera-se. Os genes não definem o destino, a envolvência social é determinante no futuro de qualquer indivíduo”. Estudos científicos comprovaram que “há diferenças entre um detentor de um doutoramento e o de um mestrado, o doutorado tem maior esperança de vida". Outro estudo apresentado por Marmot demonstra que há mais stress, por exemplo, num operário de uma fábrica do que num administrador de topo. Este "sabe que o que está a fazer é importante, há realização profissional, tem mais controlo sobre o seu trabalho”. O operário tem que pedir para ir à casa de banho, só tem que fazer o que lhe é dito, não tem qualquer controlo sobre o seu trabalho". Assim, este estudo veio desmentir a ideia de senso comum de que as funções de maior responsabilidade trazem consigo mais stress e, por isso, mais doença cardiovascular.

Marmot mostrou ainda um gráfico com uma escala que relaciona o grau de saúde mental com o tipo de vínculo laboral que se tem - dos que trabalhavam sem contrato, aos que têm trabalho temporário, aos que têm contrato a termo e os que estão integrados nos quadros. O estado de saúde mental é muito pior entre os que têm formas de trabalho mais precárias e alcança os melhores níveis entre os trabalhadores com estabilidade laboral. A precariedade laboral é causa de piores níveis de saúde mental. Este investigador apresentou também um estudo realizado em Glasgow que comprova que, naquela cidade, há uma diferença de 28 anos entre a esperança média de vida dos habitantes das partes mais pobres em relação às partes mais ricas.

3. O exemplo de Descartes e os estudos apresentados por Marmot demonstram que às vezes, em determinados momentos da história, é necessário fazer uma análise muito profunda aos fundamentos em que assentam as nossas crenças sobre o modo como conhecemos o mundo: o mundo físico mas também o mundo social. Que é necessário uma análise muito profunda, digo eu, aos pressupostos em que assentam muitas das teorias superiormente defendidas pelos nossos economistas, pelos nossos sociólogos, pelos nossos jornalistas, pelos nossos comentadores, pelos nossos políticos. São estes eternos “especialistas” em impostos, em finanças, em educação, em saúde, em justiça social que nos vêm formatando através dos Mass Media para as mesmas teorias que apresentam sempre os mesmos (embora desastrosos) resultados. As medidas de austeridade, de desinvestimento na educação, de desleixo pelo desemprego, de aniquilação dos apoios sociais, de precarização dos vínculos laborais são decisões que conduzem sempre à dilatação das desigualdades sociais, ao aumento dos suicídios, à diminuição da esperança média de vida dos mais pobres, ao aumento dos problemas de saúde mental e a um futuro cada vez pior dos mais pobres e desfavorecidos. Há fortes razões para uma dúvida “hiperbólica” cartesiana sobre o modo como a classe neoliberal lidera este país e respectivos paradigmas sociais em que assentam as suas decisões políticas. A menos que queiramos viver na “idade das trevas”.

*Dados consultados em www.publico.pt

Ética e vida!














“A vida não é como os medicamentos, que trazem todos uma “literatura inclusa” onde se indicam as contra-indicações do produto e se indicam as doses a consumir. A vida é-nos dada sem receita e sem literatura inclusa”.
Fernando Savater

06 março 2012

O utilitarismo insustentável

Dois eticistas das universidades de Melbourne e Oxford defendem no "Journal of Medical Ethics" que matar recém-nascidos é eticamente justificável pelos mesmos motivos, incluindo motivos "sociais" e "económicos", por que se permite o aborto. Gente respeitável como Peter Singer havia já admitido, em nome do mais radical neo-utilitarismo moral, o direito a matar recém-nascidos deficientes profundos cuja sobrevivência fosse expectavelmente origem de infelicidade para o próprio e família. Ninguém tinha ido ao ponto (até os mais primários pós-benthamianos reconhecem, em geral, limites à mera aritmética do sofrimento-prazer e infelicidade-felicidade) de justificar a morte de bebés saudáveis com "os encargos sociais, psicológicos e económicos" que os pais suportariam com eles. Fizeram-no agora os autores do ominoso artigo do "Journal of Medical Ethics", alegando que o bebé não é "ainda" uma pessoa no sentido de "sujeito de um direito moral à vida" pois não tem ainda "expectativas". Fica aberta a larga porta da Ética para que velhos, doentes incuráveis e, porque não?, reformados ou desempregados sem hipótese de regresso ao mercado do trabalho, que não são "já" pessoas pois deixaram de ter "expectativas", possam ser abatidos de modo a poupar "encargos" à família e ao Estado. Não há-de ser difícil justificá-lo, como fez a dra. Ferreira Leite com os idosos dependentes de hemodiálise e sem meios para a pagar.

Manuel António Pina (foto) escreveu este artigo no JN

Podes ler o artigo original publicado no Journal of Medical Ethics aqui

01 março 2012

Por falar em prazer!

Não sei se tens lido muito a Bíblia. Está cheia de coisas interessan­tes e não é preciso ser-se muito religioso - bem sabes que o sou muito pouco - para as apreciar. No primeiro dos livros da Bíblia, o Génesis, conta-se a história de Esaú e Jacob, filhos de Isaac. Eram irmãos gémeos, mas Esaú fora o primeiro a sair do ventre da mãe, o que lhe concedia o direito de primogenitura: ser primogénito naqueles tempos não era coisa de somenos importância, porque significava a sorte de se herdarem todas as posses e privilégios do pai. Esaú gostava de ir à caça e de andar em busca de aventuras, enquanto Jacob preferia ficar em casa, confeccionando de quando em vez algumas delícias culinári­as. Um dia, Esaú voltou do campo cansado e faminto. Jacob preparara um suculento guisado de lentilhas, e o irmão, só de sentir o aroma do cozinhado, ficou cheio de água na boca. Apeteceu-lhe intensamente comer aquele prato e pediu a Jacob que o convidasse. O irmão cozi­nheiro disse-lhe que o faria com muito gosto, mas não grátis, antes, em troca do direito de primogenitura. Esaú pensou: «Agora o que me apetece são as lentilhas. A herança do meu pai é para daqui a muito tempo. Quem sabe? Talvez eu morra até antes dele!» E acedeu a trocar os seus futuros direitos de primogénito pelas saborosas lenti­lhas do presente. Deviam ter um cheiro esplêndido aquelas lentilhas! Não é preciso dizer-te que mais tarde, com a pança já cheia, Esaú se arrependeu do mau negócio que tinha feito, o que provocou bastantes problemas entre os dois irmãos.
Esaú queria as lentilhas, esforçou-se por consegui-las e no fim ficou sem a herança. Belo resultado!» Sim, claro, mas... seriam as lentilhas o que Esaú queria deveras, ou não passavam do que lhe apetecia naquele momento? Afinal de contas, ser o primogénito era então uma coisa muito vantajosa, enquanto as lentilhas, bem vês: se quiseres comes, se quiseres deixas de parte... É lógico pensar que aquilo que Esaú, no fundo, queria era a primogenitura, um direito que prometia tomar-lhe a vida muito melhor dentro de um prazo mais ou menos curto. Evidente­mente, também lhe apetecia comer o guisado, mas, se se tivesse dado ao trabalho de pensar um bocadinho, ter-se-ia dado conta de que esse segundo desejo poderia esperar um pouco, sem que ele tivesse de comprometer as suas possibilidades de conseguir o fundamental. (...)

Nós, seres humanos, queremos às vezes coisas contraditórias, que entram em conflito umas com as outras. É importante sermos capazes de estabelecer prioridades e de impor uma certa hierarquia entre o que me apetece no imediato e aquilo que, no fundo, a longo prazo, quero. Quem o não perceber à primeira, pode perguntar a Esaú...
Apetecem-te com certeza muitas coisas, amiúde contraditórias, como acontece com toda a gente: queres ter uma moto mas não queres partir a cabeça no asfalto, queres ter amigos mas sem perderes a tua independência, queres ter dinheiro mas não queres sujeitar-te ao próximo para o conseguires, queres saber coisas, e por isso compreendes que é preciso estudar, mas também queres divertir-te, queres que eu não te chateie e te deixe viver à tua maneira, mas também que esteja presente para te ajudar quando necessitas disso, etc. Numa palavra, se tivesses que resumir tudo isto e pôr sinceramente em palavras o teu desejo global e mais profundo, dir-me-ias: «olha, pai, o que eu quero é ter uma vida boa.» Bravo! O prémio para este senhor!
O que é bom é usarmos os prazeres, ou seja, termos sempre certo controlo sobre eles, não lhes permitindo que se voltem contra o mais que forma a tua existência pessoal. Lembra-te de como há umas largas páginas atrás, a propósito de Esaú e das suas lentilhas, falámos da complexidade da vida e de como era recomendável, para a vivermos bem, não a simplificarmos em excesso. O prazer é muito agradável, mas tem uma aborrecida tendência para a exclusividade: se te entregares a ele com demasiada generosidade, ele é muito capaz de te deixar sem nada a pretexto de te satisfazer. Usar os prazeres, como diz Montaigne, é não permitir que qualquer deles apague a possibilidade de todos os outros.

Ética para um Jovem, Fernando Savater, Gradiva
(pags. 55,56 e 105)

A Felicidade, segundo Stuart Mill

“Os críticos do utilitarismo raramente têm a justiça de reconhecer: que a felicidade que forma o padrão utilitarista sobre o que está certo na conduta não é a felicidade do próprio agente, mas a de todos os envolvidos. Quanto à escolha entre a sua própria felicidade e a felicidade dos outros, o utilitarismo exige que ele seja tão estritamente imparcial como um espectador benevolente e desinteressado. Na regra de ouro de Jesus de Nazaré lemos todo o espírito da ética da utilidade. Tratar os outros como que­remos que nos tratem e amar o nosso próximo como a nós próprios consti­tuem a perfeição ideal da moral utilitarista. Como meio de fazer a maior apro­ximação possível a este ideal, a utilidade prescreve, em primeiro lugar, que as leis e estruturas sociais coloquem tanto quanto possível a felicidade ou (como se lhe pode chamar para falar de maneira prática) o interesse de qualquer indivíduo em harmonia com o todo; em segundo lugar, que a educação e a opinião, que têm um poder tão vasto sobre o carácter humano, devem ser usadas para estabelecer na mente de todos os indivíduos uma associação indissolúvel entre a sua própria felicidade e o bem do todo, especialmente entre a sua própria felicidade e a prática daqueles modos de conduta, negativos e positivos, que a consideração pela felicidade universal prescreve, não só de modo a que estes possam ser incapazes de conceber consistentemente a possibilidade da felicidade para si próprios a par de uma conduta oposta ao bem geral, mas também de modo a que um impulso direc­to para promover o bem geral possa ser em todos um dos motivos habituais das acções, e que os sentimentos ligados a isto possam ocupar um lugar amplo e proeminente na exis­tência sensível de qualquer ser humano.

J. S. Mill, Utilitarismo, p. 64

23 fevereiro 2012

O sujeito é produto da sociedade?

Os homens fazem a sua história mas não a fazem livremente - é condicionada pela estrutura social

(Marx)

O sujeito é produto da sociedade e a história é independente da vontade dos indivíduos.

(Durkheim)

Deixa aqui o teu comentário ao filme "Cidade de Deus", procurando relacioná-lo com as ideias de Marx e Durkheim acima transcritas.

15 fevereiro 2012

Existirão factos morais?

"Um juízo moral - ou qualquer outro juízo de valor - tem de ser apoiado em boas razões. Se alguém disser que uma determinada acção seria errada, pode-se perguntar por que razão seria errada e, se não houver uma resposta satisfatória, pode-se rejeitar esse conselho por ser infundado. Neste aspecto, os juízos morais são diferentes de meras expressões de preferência pessoal. Se alguém diz «eu gosto de café», não necessita de ter uma razão para isso; poderá estar a declarar o seu gosto pessoal e nada mais. Mas os juízos morais requerem o apoio de razões, sendo, na ausência dessa razões, meramente arbitrários. Qualquer teoria adequada da natureza da avaliação moral deveria, portanto, ser capaz de dar conta das relações entre juízos morais e as razões que os sustentam. (...) Hume sublinhava que se examinarmos as acções malévolas - «homicídio voluntário, por exemplo» - não encontramos «matéria de facto» que corresponda à maldade. Excluindo as nossas atitudes, o universo não contém tais factos. Esta tomada de consciência tem frequentemente sido entendida como motivo de desespero, porque as pessoas presumem que isto deve significar que os valores não têm estatuto «objectivo». Mas porque razão deveria a observação de Hume surpreender-nos? Os valores não são o tipo de coisas que possam existir como existem as estrelas e os planetas. (Concebido desta maneira, qual seria o aspecto de um «valor»?) Um erro fundamental no qual incorrem muitas pessoas quando pensam sobre este assunto é partir do princípio de que há apenas duas possibilidades:

1. Há factos morais da mesma maneira que há factos sobre estrelas e planetas; ou

2. Os nossos valores não são mais que a expressão dos nossos sentimentos subjectivos.

Isto é um erro porque descura uma terceira possibilidade crucial. As pessoas não têm apenas sentimentos, têm também razão, e isso faz uma grande diferença. Pois pode ser que

3. As verdades morais [sejam] são verdades da razão; isto é um juízo moral é verdadeiro se for sustentado por razões melhores que os juízos alternativos. (...) Tais verdades são objectivas no sentido em que são verdadeiras independentemente do que possamos querer ou pensar. Não podemos tornar algo bom ou mau pelo simples desejo de que seja assim, porque não podemos simplesmente querer que o peso da razão esteja a favor ou contra algo. Isto explica igualmente a nossa falibilidade: podemos enganar-nos sobre o que é bom ou mau porque podemos estar enganados sobre o que a razão recomenda. A razão diz o que diz, alheia às nossas opiniões e desejos."

James Rachels, Elementos de Filosofia Moral, Gradiva (texto adaptado)


09 fevereiro 2012

Devemos ser "tolerantes" com a atitude do pai?

Pai entrega filho homossexual à PSP

Um pai entregou numa esquadra da PSP, em Vila Nova de Gaia, o seu filho de 15 anos, depois de ter descoberto na madrugada de quinta-feira que ele era homossexual. (Jornal CORREIO DA MANHÃ)

Ler mais aqui

Contra-argumento à Teoria dos Mandamentos Divinos

Canadá: prisão perpétua para família islâmica que assassinou três filhas
Um tribunal do Canadá condenou ontem Mohammad Shafia, a sua segunda mulher e filho de ambos, a prisão perpétua pelo assassinato de quatro elementos da família. O casal afegão a residir no Canadá decidiu assassinar as três filhas e a primeira mulher do patriarca num casamento poligâmico. Os procuradores afirmaram que o crime foi cometido por as raparigas terem "desonrado" a família, ao não obedecerem ao estrito código islâmico, pelo modo como se vestiam, por saírem com rapazes e por utilizarem a Internet.
Ler mais aqui (jornal EXPRESSO)

Para que serve a ética?

06 fevereiro 2012

Porque é que o subjetivismo não explica os desacordos morais?

Para o subjetivista parece não haver ideias opostas sobre a mesma realidade porque o valor de verdade de qualquer facto moral depende apenas do sujeito (se expressar com sinceridade o seu sentimento, o juízo moral é verdadeiro; se for o contrário é falso).
Vejamos o seguinte juízo moral:
“O extermínio de judeus pelos nazis foi correto.”
Segundo os subjetivistas este juízo será verdadeiro se o sujeito expressar o que, de facto, pensa; e será falso se disser o contrário daquilo que pensa. Mas afirmar que “o extermínio dos judeus é correto” é diferente de afirmar que “o extermínio dos judeus é incorreto”. O 1º e o 2º juízo revelam realmente que há desacordo de dois sujeitos quanto ao extermínio de judeus e, por isso, um será verdadeiro e outro falso. Mas para o subjetivista revelam apenas que os dois sujeitos têm sentimentos diferentes relativamente ao facto moral “extermínio de judeus” e ambos são verdadeiros. Ora, há aqui uma contradição real: o extermínio de judeus não pode ser simultaneamente correto e incorreto. Por outro lado, sendo os dois juízos verdadeiros não faz sentido debater o tema, seria um ato inútil, considerando que não há uma verdade independente de cada sujeito. Inviabilizando o debate racional, o subjetivismo torna absurdo qualquer esforço racional para encontrar os melhores princípios éticos e respetiva justificação.

27 janeiro 2012

Sistema de valores racional

Um sistema de valores é "racional" — e, nessa medida, digno de respeito — caso se baseie numa correcta compreensão dos factos e numa preocupação em considerar todas as pessoas de igual modo. O nazismo, a escravatura, a segregação racial são irracionais — têm a ignorância como único fundamento ou constituem violações da exigência de imparcialidade para com os nossos semelhantes.

Harry Gensler

Extraído daqui


O que é a moral?

O que é a moral? É o conjunto das coisas a que um indivíduo se obriga ou que proíbe a si mesmo, não para aumentar a sua felicidade ou o seu bem estar, o que não passaria de egoísmo, mas para levar em conta os interesses ou os direitos do outro, para não ser um malvado, para permanecer fiel a uma certa ideia da humanidade e de si. A moral responde à questão Que devo fazer? — é o conjunto dos meus deveres, ou seja, dos imperativos que reconheço como legítimos —- mesmo que, como qualquer pessoa, ocasionalmente os viole. É a lei que imponho a mim mesmo, ou que deveria impor-me, independentemente do olhar do outro e de qualquer sanção ou recompensa esperadas.

COMTE-SPONVILLE, André - Dictionnaire philosophique

Como responder à diversidade cultural entre sociedades?


Ana rejeita a atitude dogmática do género “Nós estamos certos e eles errados”. Percebe a necessidade de compreender as sociedades. Estas são ideias positivas. Mas, em seguida, afirma também que nenhum dos lados pode estar errado. Isto limita a nossa capacidade para aprender. Se a nossa cultura não pode estar errada, não pode aprender com os seus próprios erros. Compreender as normas de outras culturas não permitirá ajudar-nos a corrigir os erros (…) [da nossa cultura, uma vez que esta não está errada (ou certa)]. Ana rejeita a crença em valores objectivos e chama-lhe o “mito da objectividade”. Nesta perspectiva, as coisas são um bem ou mal apenas relativamente a esta ou àquela cultura. Não são objectivamente boas ou más, como Kant pensava. Mas será [a objectividade dos valores] realmente um “mito”? O ponto de vista objectivista [ou essencialista] afirma que algumas coisas são objectivamente um bem ou um mal, independentemente do que possamos pensar ou sentir; contudo, esta perspectiva está preparada para aceitar algum relativismo noutras áreas. Muitas regras sociais são claramente determinadas por padrões locais: Regra local: “É proibido virar à direita com a luz vermelha”. Regra de etiqueta local: “Use o garfo apenas com a mão esquerda”.
É necessário respeitar este género de regras locais; ao proceder de outra maneira podemos ferir as pessoas, quer porque chocámos contra os seus carros, quer porque ferimos os seus sentimentos. Na concepção objectivista, a exigência de não magoar as outras pessoas é uma regra de um género diferente – uma regra moral – não determinada por costumes locais. Considera-se que as regras morais possuem mais autoridade do que as leis governamentais ou as regras de etiqueta; são regras que qualquer sociedade deve respeitar se quiser sobreviver e prosperar. Se visitarmos um lugar cujos padrões permitem magoar as pessoas (…), então esses padrões estão errados. O relativismo cultural disputa [discorda] esta afirmação. A ideia é que os padrões locais são determinantes, ainda que se trate de princípios morais básicos; assim, ferir outras pessoas (…) é um bem se esta atitude for socialmente aprovada. Respeitar as diferenças culturais não nos transforma em relativistas culturais. Este é um falso estereótipo. O que caracteriza o relativismo cultural é a afirmação de que tudo o que é socialmente aprovado é um bem”.
(Texto adaptado) Harry Gensler, Ética e Relativismo Cultural

12 janeiro 2012

Estamos determinados pelos acontecimentos anteriores?

Segundo o determinismo radical, o livre-arbítrio é incompatível com o determinismo, isto é, se tudo está causalmente determinado não temos livre-arbítrio (capacidade de escolher em liberdade). Como tudo está determinado, o livre-arbítrio não existe. Sendo assim, perante determinada situação, e caso os acontecimentos anteriores não se alterem, não podemos agir de modo diferente daquele que agimos, isto é o mesmo que afirmar que, dada uma certa cadeia causal, o seu efeito não pode ser diferente do que é. O determinista radical define “estar causalmente determinado” como a impossibilidade de alguém poder decidir e querer algo diferente daquilo que efectivamente decidiu. Assim, para o determinista radical a liberdade é uma mera ilusão, pois, por vezes temos a falsa sensação de liberdade porque fazemos aquilo que queremos sem que ninguém nos impeça de fazê-lo, não conhecendo as verdadeiras causas que motivaram essa acção. Contudo, existem histórias de vida que provam a existência da liberdade e que nem sempre somos constrangidos por acontecimentos anteriores, ou seja, nem sempre o nosso passado nos impede de chegar onde queremos, basta saber usar corretamente a nossa liberdade…

A história de Nick é um óptimo exemplo “disso” mesmo. Nick teve a infelicidade de nascer sem membros (superiores e inferiores), estando à partida, determinado a tornar-se uma pessoa incapacitada para o resto da sua vida. Contudo, ele conseguiu provar que ninguém está determinado pelo seu passado, pois, caso isso fosse verdade, atualmente Nick não faria aquilo que faz (note-se que os acontecimentos passados mantiveram-se os mesmos) como: jogar à bola, surfar, pentear o cabelo, lavar os dentes entre outras tarefas. As quais, analisando os acontecimentos antecedentes (o facto de ter nascido sem extremidades), seriam impossíveis de ser concretizadas. Porém, Nick, soube usar eficientemente a sua liberdade e construir o seu próprio projecto de vida, encargo esse que foi verdadeiramente condicionado pelo seu passado, mas não impedido. Nick não se limitou a ficar parado, pelo contrário, decidiu lutar contra os obstáculos que a vida lhe proporcionou, mostrando que o livre- arbítrio, isto é, esta capacidade de decidir em liberdade existe mesmo, não sendo apenas uma mera ilusão como o determinista radical defende. Liberdade essa que quando utilizada correctamente/com inteligência (tal como Nick fez), só nos favorecerá…

(Texto e Vídeo sugerido por Cristina Coelho-10ºB)

O teu tempo é limitado!



“O teu tempo é limitado, por isso não o gastes a viver a vida de outra pessoa. Não caias na armadilha do dogma, que é viver de acordo com os resultados do pensamento de outras pessoas. Não deixes que o barulho criado pela opinião dos outros silencie a tua voz interior. E, acima de tudo, tem a coragem de seguir o teu coração, a tua intuição.”
Steve Jobs (fundador da Apple)

Somos tão livres como um computador?


O problema acerca da existência da liberdade humana pode ser apresentado numa formulação preliminar. As nossas crenças e desejos, e portanto, o nosso comportamento, são causados por coisas fora do nosso controlo. Não escolhemos livremente os nossos genes nem a sequência de ambientes em que crescemos. Se não os escolhemos livremente, porquê dizer que o nosso comportamento é o resultado de uma escolha livre da nossa parte? Como podemos ser responsáveis por ações causadas por acontecimentos (que tiveram lugar há muito tempo) sobre os quais não exercemos qualquer controlo? Aparentemente, somos tão livres como um computador: um computador comporta-se como o faz porque foi programado para isso.

Elliott Sober, Tradução de Paulo Ruas
Core Questions in Philosophy

Programação das AULAS DE FILOSOFIA - RTP Madeira com o Prof. Rolando Almeida

Podes aceder às aulas de Filosofia da RTP Madeira, lecionadas pelo Prof. Rolando Almeida (na foto), acedendo aos links abaixo.  TELENSINO (R...