22 abril 2015

A justiça como equidade face à utilidade média

Rawls pretendeu demarcar a teoria equitativa da justiça do utilitarismo, argumentando que os princípios da justiça ganham vantagem face à teoria utilitarista, quer clássica quer contemporânea, porque, por um lado, garantem direitos e liberdades básicas iguais para todos e, por outro, impedem possibilidades injustas e, por isso, intoleráveis, ao não considerar a utilidade média como resultado aceitável para uma sociedade bem ordenada. É o principio da diferença que permite essa demarcação de Rawls face ao utilitarismo.

Segundo o “princípio da utilidade”, todas as ações humanas devem ser orientadas para alcançar a felicidade do maior número, chegando-se assim à felicidade ou ao interesse geral através da soma dos interesses pessoais.
Várias críticas têm sido imputadas à teoria utilitarista. Uma delas é que a ética utilitarista está em conflito com a justiça, considerando que certas injustiças podem maximizar a felicidade.
Outra crítica dirigida ao utilitarismo diz respeito à questão da violação de direitos absolutos dos indivíduos, encobertos, eventualmente, pelo referido princípio da felicidade geral. Rawls afirma (1993, p. 44) que cada indivíduo possui direitos invioláveis (direitos naturais) que “nem sequer em nome do bem-estar de todos os outros membros” poderão ser afastados, acrescentando que “é contrário à justiça que a perda da liberdade para alguns seja compensada pela partilha de um bem maior entre os restantes”.
Assim sendo, a teoria utilitarista, como não tem em conta as especificidades do sujeito (nem as suas caraterísticas “naturais”, força de vontade ou esforço), não examina, aparentemente, se a felicidade geral é distribuída de maneira igual ou desigual, se deixa uma parte dos indivíduos numa sociedade em situação miserável, por sujeição ao princípio da utilidade, pois o que apenas conta é a utilidade média, o saldo líquido resultante da soma da felicidade de cada indivíduo na sociedade. Por exemplo, grandes diferenças entre rendimentos de pessoas muito ricas e rendimentos de pessoas muito pobres podem ser toleradas desde que no final de contas tenha sido maximizada a felicidade geral.
Este é um ponto de discórdia elementar entre a teoria de Rawls e o utilitarismo e, pode dizer-se, uma marca de identidade da teoria (liberal) da equidade: só há justiça social quando a distribuição de encargos e benefícios na sociedade beneficiar todos, mas em particular os menos favorecidos[1]. O princípio da diferença exige da estrutura básica e do Estado e respetivas instituições, um mínimo social que não só garanta dignidade da pessoa mas também maximize as perspetivas de vida dos menos favorecidos ao longo do tempo.[2]



[1] Segundo Rawls “menos favorecidos”  são os indivíduos que beneficiam de “liberdades básicas iguais e oportunidades equitativas, mas têm a pior rendimento e riqueza.” (2003, p.92)
[2] Acrescente-se ainda que Rawls encara certas desigualdades como justas, tais como a desigualdade de rendimento, procurando, deste modo conciliar igualdade e eficiência. Uma sociedade onde não houvesse desigualdade económica tornaria as pessoas pouco produtivas e esta fraca produtividade seria prejudicial para todos.

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