Um argumento pode parecer sólido e não ser. Porque podemos estar enganados ao pensar que as suas premissas são todas verdadeiras. Certo? Mas não podemos estar enganados sobre a plausibilidade das premissas: o plausível é, por definição, a nossa avaliação de uma dada proposição, não é uma medida objectiva de probabilidades.
Para ser bom ou cogente, um argumento tem de ter três condições (que todavia talvez não sejam suficientes): validade, verdade das premissas e premissas mais plausíveis do que a conclusão. Basta falhar uma destas condições e o argumento não é bom. Assim, um argumento pode parecer bom sem o ser porque, apesar de válido e apesar de ter premissas mais plausíveis do que a conclusão, tem premissas falsas. Imagina o seguinte argumento, apresentado no tempo de Ptolomeu:
Se a Terra se movesse, sentiríamos o movimento.
Mas nós não sentimos o movimento.
Logo, a Terra não se move.
Este argumento é válido. E uma pessoa, no tempo de Ptolomeu, poderia achar que as premissas são mais plausíveis do que a conclusão. Afinal, nós hoje só sabemos que a premissa 1 é falsa porque temos uma teoria complexa que nos explica por que razão não sentimos tal movimento. Assim, aqui temos um argumento válido com premissas mais plausíveis do que a conclusão e que muitas pessoas poderiam considerar bom ou cogente no tempo de Ptolomeu. Mas essas pessoas estariam decerto enganadas. Não queremos com certeza aceitar que este argumento é realmente bom — pois se o fosse, teríamos de aceitar a sua conclusão. Por outro lado, é óbvio que o argumento é válido. E tem premissas mais plausíveis do que a conclusão, pelo menos quando as pessoas estão num dado estado cognitivo (como Ptolomeu estava). O que falha, então? Falha a premissa, que é falsa, sem que os ptolemaicos o soubessem. Mas o argumento não é menos mau só porque eles não sabiam que a premissa é falsa. O argumento é mau, precisamente porque não é sólido — mas eles não sabiam que não era sólido.
Desidério Murcho
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